terça-feira, setembro 09, 2008

Guerra dos mudos


Os dias correm-te por entre a amargura de uma vida repleta de desilusões. Agarras-te com força ao que tens, com medo de cair em algo que desconheces, e vejo as tuas lágrimas choverem por entre sorrisos azuis.

Agarrado a algo que há muito deixou de ser, mas por imposição das aparências manténs bem firme, procurando que amanhã seja diferente de hoje, esqueces-te apenas que diferente nem sempre é melhor.

Amanhã chega, e o ontem bate-te com a porta na cara quando o tentas fixar nos olhos. A oportunidade foi-se embora, e o teu silêncio impera nesse teu reino tão pequenino.

És mais, és tão maior que um gigante Liliputiano resignado a essa guerra feroz entre dois mudos que outrora foram amantes.

Talvez as palavras que vais deixando sair em tom de apelo sejam suficientes, e os poucos olhares que derramas complacente nesse teu refúgio sejam suficientes, e os amores quase platónicos que sofres sejam suficientes… talvez.

A gentileza dos teus gestos devia ser permanente, sabes? Devias olhar um pouco para ti, e descobrir de que cor querias pintar os teus dias, para cobrir esse sépia envelhecido que vais deixando a cada passo.

Os teus bolsos são demasiado fundos, e esses nadas demasiado pesados.


Mais uma chance, só mais uma, de mil que estão p’ra trás, e mais mil que estão pela frente, e a vida vai-te passando pelas mãos sem teres tempo de a chegares a viver. Mais uma batalha, com silêncios de espada em punho, e olhares de caçadeira nas mãos.

Mais uma hipótese, as coisas mudam, vai ser diferente, quando no fundo também não acreditas nessa mudança, e de cada vez que sorris, os castelos derretem e naufragas novamente deitado na tua própria cama.

O amor há muito passou a memória, a memória há muito passou a ódio, e o tempo… há muito que apenas passou.



Entre o ódio e o amor, existe um espaço muito cómodo a que chamaram casamento. Talvez o leves demasiado a sério, talvez os outros o levem demasiado a brincar... talvez, e apenas talvez, mais uma chance te leve para o lado errado desse abismo que vos une.
Mas como sempre, cá estarei.

segunda-feira, setembro 01, 2008

Bruma Nocturna

E descobrir que estou a correr há tanto tempo apenas para ficar parada no mesmo sítio.
Olho o céu onde deixaste cair tantos pingos de lixívia e tento encontrar um padrão, mas ele está desfocado pelas cinzas do vento. Ao redor apenas uma brisa aconchegante, tudo o resto foi levado para a estratosfera de um planeta que nunca cheguei a ver. As circunstâncias ensinam-me a dançar o tango, termino exausta e sem forças, sem vontades. Esgoto as conversas com o copo, agora vazio, procurando no seu interior algo que me diga se o devo voltar a encher… talvez não.
Sento-me num chão qualquer, pernas esticadas e mente encolhida. Os pensamentos taciturnos vão-me fazendo festas no cabelo e eu afasto-os com as minhas mãos pequenas, que vão agarrando os pensamentos alegres que insistem em contar-me anedotas novas, deixando-me a sonhar com mundos de outras cores, a sorrir com lábios de outras gentes, a viver com o coração que roubei do livro de histórias de uma criança pequena.
Sou assim, vulto esbatido pela borracha de um disco voador que avança sem rumo e sem pressa. Alegre de ser, sem saber se de facto vivo ou se apenas me deixo viver.
Ainda sinto o latejar das cicatrizes profundas deixadas pelos vidros partidos nas minhas mãos, ainda insisto em apostar a minha vida em jogos irresponsáveis, sabendo que saio sempre ilesa, ninguém arrisca a minha vida, como se ela tivesse algum significado além de mais um pulsar ritmado pelas colunas estéreo que acordam os vizinhos.
Bebo mais um golo do copo que voltei a encher, o suave torpor do álcool vai tomando conta de mim, levando-me a escapar maleável por entre os vossos dedos, e mesmo debaixo dos vossos olhos.
Refugio-me uma vez mais nos braços da noite, longe de toda a vida, onde sei que ninguém me encontra. Incontactável no meio de brumas passageiras, irresponsável pela preocupação que rasteja atrás de mim, sem pensar, sem sentir. A minha mão escondida debaixo da minha cabeça, amparando-a e dizendo-lhe o caminho que o meu olhar deve seguir, na direcção das estrelas cadentes que passam ao meu lado, tentando-me a pedir-te como o meu próximo desejo. Resisto, uma vez mais e solto risos nervosos ao lembrar-me daquele beijo, última tentação fugaz induzida pelas saudades pulsantes nos nossos olhos.
Capricho meu, tentar fazer-te lembrar o bom que era estarmos lado a lado.Convenci-te que foi só uma brincadeira maliciosa do destino, que nos quis separar da mesma forma que nos tinha unido.
Caiu mais uma estrela no momento em que eu fechei os olhos para te saborear uma vez mais, deixando-me levar pelas folhas que dançavam ao sabor dos meus suspiros e sorrindo deixo-me morrer, agarrada aos delírios que tinhas deixado espalhados ao meu lado.