domingo, junho 25, 2017

E no lugar vazio ao meu lado ficou a lembrança morna da tua presença. Nos meus ouvidos ecoam os risos das horas suadas nas tuas mãos e na minha pele arrepia-se a memória do teu respirar pausado ao amanhecer. Nada mais que um toque ligeiro a desafiar o calor da noite me fazia saber que estavas ali, exausto, quieto, entregue ao silêncio da minha companhia. E as horas são sempre poucas, quero que fiques mas deixo-te ir embora. Seguro a porta enquanto avanças, e nem percebo se olhas para trás. A minha incerteza compele-me a ficar quieta, deixar que o silêncio me absorva uma vez mais. Recuso-me a pedir mais, a exigir mais... Não sou nem quero ser a miúda que corre atrás do que quer, até porque nem sei o que quero. Vou-me contentando com as migalhas que apanho por aí sem reclamar. Quero-te ou não? Quando a tua ausência dói, mas a tua presença me silencia? Vontade de gritar, mas nem sei que palavras imprimir no vento, então fico, quieta, calada, vazia... Talvez sejas apenas a ocupação de horas vagas, ou talvez sejas o pedacinho que preenche aquele canto tão bem escondido de mim, mas o hábito de fugir continua enraizado em mim, a noção instintiva de não ser suficiente na vida de ninguém, o saber-me inconveniente... Jamais saber o que dizer, inadaptada às convenções, e terás tu a capacidade de ver isso?
De saber ensinar-me a ser diferente, ou aceitar essa faceta tão bem marcada nos meus dias? E queres sequer descobrir o significado do vazio nos meus olhos? A mudança da respiração alguns minutos antes de me afogar em lágrimas secas? O nó na garganta que reaparece apenas porque as horas não são suficientes? Deixo respostas a meio, porque após a tua pergunta a resposta é irrelevante, e sou ingénua, deixo-me levar pelo instinto e começo a responder, só para depois me calar, sufocada pelas lágrimas secas que me escorrem nas costas. Gestos que caem no chão ao fazerem ricochete em ti, distante, frio, inconsequente... Ingénua, meia adulta, meia miúda que queria acreditar.
Tantas vezes grito para mim mesma, e nem assim me oiço, insuficiente, incoerente, ingénua... Sufoco um soluço, como que a castigar-me por ser. Não mereço o alívio das lágrimas, e sem pena tento aconchegar a resignação de saber quem sou e que isso tem de chegar, junto àquele traidor que me faz tentar responder a perguntas e deixar que alguém se aproxime... Espera, deixar-me aproximar de alguém e acreditar que não existe um fosso profundo entre nós.
Olho no espelho e não percebo como não vês a tristeza impressa no meu rosto, a insegurança, a exaustão de quem apenas quer deixar de ser... E sem quaisquer pensamentos auto-destrutivos, gostava de cessar a minha existência, começar de novo, ser outra pessoa qualquer... Deixar de pensar, de sentir, de acreditar. Porque me conheço, e dói tão mais do que devia... Porque a pieguice eleva a dor ao seu expoente máximo e ainda lhe acrescenta mais qualquer coisa para o caminho. Porque existo pela metade, e não faço ideia de onde deixei o resto.
Porque não quero ser singular, mas também não sei viver no plural. Ninguém nos ensina o que dizer, quando dizer, o que fazer ou sentir ou esperar. Medos tatuados por anos de desilusões e feridas que teimam em não cicatrizar, a noção do ridículo de tudo isto. Faço pouco de pessoas assim, e por isso reservo-me o direito de troçar de mim mesma. Não é da sensibilidade, mas do apego aos nadas, do que me prende, do que escondo, de quem sou e por quem sou. Do riso nervoso, do que dói, das ilusões, da tristeza, do levantar a cabeça e fingir que tudo está bem, da farsa em que vivo, apenas para não ter de responder...
Faço troça, rio-me sem vontade e sem prazer, o sarcasmo contraditório com a vontade de te dizer... O um dia destes eu falo, amanhã, amanhã eu digo, porque hoje (e insiro uma desculpa vazia neste espaço). Adio cobardemente o falar, que só tem 2 resultados possíveis, e nenhum deles me reconforta.

terça-feira, junho 14, 2016

Sentes-te a cair e sabes que não há uma rede de segurança. Não vês o fundo e a paisagem confunde-se com os pesadelos que te atormentam.

Tentas gritar, mas o ar prende-te os movimentos, não emites nenhum som, não te consegues mexer, não consegues ver.

Enclausurada em mim, lágrimas dançam no meu peito mas controlo-as, como sempre, encerro os sentimentos no mais íntimo da minha existência.

Não pode ser assim, dói pela antecipação do desastre, que sabes que está para chegar e não o podes evitar.

Porque a vida te provou, vezes sem conta, que és dispensável, e ainda assim sonhas em ser o centro da vida de alguém, numa ingenuidade infantil que desprezas.

Palavras doces são insuficientes, falta alguma coisa e ainda assim atiras-te, esqueces, nem que seja por um momento, esqueces o pânico, a dor, o que sabes ou achas saber, e saltas...

Dói, sabes que dói. Destróis-te por dentro e sabes que os danos podem ser irreparáveis, mas saltas, deslizando pela doçura de palavras nas quais não acreditas, imaginando as escarpas que te aguardam no fim da queda livre. Muda, com um nó apertado na garganta, mesmo sabendo que o teu silêncio tem um preço...

As palavras saem-me dos dedos, porque o anonimato de não sentir os teus olhos expectantes nos meus permite-me ser...

Saltei mas estou à espera que doa. Aguardo num misto de adrenalina e pânico, porque sei que vou sentir o impacto, que a pele se vai rasgar por dentro, sei...

Saltei sem rede, sem norte, sem coragem, mas saltei, e agora nada falta senão esperar...

terça-feira, maio 31, 2016

Não vales a pena, e sabes disso.
Não vales lágrimas preocupações ou noites sem dormir. Não há generosidade que compense quem tu és. O espelho não te perdoa, e seja qual for o motivo, o sol põe-se sempre no mesmo sítio.

Estás aquém das expectativas. Não correspondes aos padrões impostos pela sociedade, mais ou menos perfeita, mas não encaixas. Não és mais que um cenário, figurante dispensável na vida de outréns. És um ponto de interesse volátil, algo que enriquece o enredo nalgum momento, mas que não faz diferença no resultado final. E talvez alguns entendidos dessem pela tua falta, daquele extra, daquele 1% a mais, mas se fosse qualquer outro no teu lugar...

Cansada de ser mais uma, de estar a mais, de incomodar... Cansada de pessoas que se contentam com a minha presença, mas que estariam bem melhor com alguém mais... Qualquer coisa. Cansada de ser eu e incapaz de ser outra coisa qualquer, no limbo que define uma rotina que não escolhi. Resignada ao silêncio forçado, aos risos falsos, ao encaixe fingido de ser eu...

Não sou... suficiente. Fico ligeiramente à margem, no limiar, no limite do normal, do ridículo, do visível, do desejável. Sou... Apenas, e sei-me tão melhor se às vezes não fosse... Eu.

Piegas, insensível, egoísta, generosa, destemida com tantos pânicos encerrados atrás de uma fachada tão bem construída. Vês o que vês, e talvez não valha a pena veres mais que isso. Vivo no impasse da vontade e do correcto, abraçando as responsabilidades e ignorando o resto. No seio de uma vida mundana, cheia de nadas que são isso mesmo, nadas. Numa vida que não escolhi, num corpo que arrasto por aí como estandarte das minhas derrotas. Porque na minha realidade não há vitórias, nas fantasias também não, por isso ergo as derrotas como medalha sarcástica de uma corrida em que não me inscrevi.

Um passo de cada vez, inseguro e silencioso. Entro e saio das vidas alheias como se da minha casa se tratasse, poucos ficam, e mesmo esses mantenho à distância de um braço, não vá o meu desajeito tombar sobre quem não merece tal peso.

Tão pouco resta a dizer... As lágrimas não fluem como antigamente, e os sentimentos parecem ter ido com elas. Incapaz de verbalizar, de sentir ou de ser, porque são anos acumulados em cima de memórias irresolúveis.

Eu... Que um dia sorri porque o sol brilhava lá fora. Eu... Que algures no tempo acreditei, hoje, cínica, vazia, etérea... tantos nadas acumulados no mesmo sítio, e eu sem nada para fazer com eles.

segunda-feira, agosto 10, 2015

Uma espécie de despedida

"Dou um passo atrás e espero. O teu silêncio confirma aquilo que o meu instinto me gritou e que decidi ignorar"

Passou por mim, e porque me apeteceu, fui atrás. Quando uma parte de mim estava amarrada aos silêncios alheios, o meu corpo decidiu que era a escolha ideal.

"Digo alguma coisa na esperança de uma resposta, e embora ela tarde em chegar, as lágrimas recusam-se a cair."

Tomou-me o corpo de assalto e eu deixei. O risco tornou-se o combustível que o controlava e foi ele o escudo que me despreocupou dos olhares indiscretos.

"Quase consegui chorar, mas o meu outro lado atravessou-se no caminho e por isso solto uma gargalhada sonora."

Deixei que as suas mãos me explorassem o corpo e fi-lo sentir como se assim me conhecesses. A cada gemido fortaleci-lhe o ego e cada beijo incentivei mais um passo.

"Dou mais um golo no rubi que me enche o copo, mais uma gargalhada sentida e afasto-te lentamente das ideias..."

Mudamos de cenário, já não cheiro o rio nas minhas costas, já não sinto o fresco da noite a contrastar com o ardor da nossa pele. Os ruídos foram abafados e nós parecemos não dar por isso.

"As conversas fluem entre amigas, do sério aos disparates vamos resvalando nas horas como se nada mais existisse."

As minhas costas batem no puxador de uma porta e o joelho dele atira-se contra a parede. Por entre a sofreguidão a porta abriu-se pelas mãos de ambos e os nossos corpos tombaram para o interior de uma casa que dificilmente consigo retratar.

"Esvaziamos garrafas como se fossem de água e o tema vai-se tornando cada vez mais aquele que procuro evitar."
Entreguei-me à sua vontade sem resistir, sem fingir resistir e provoquei-o por entre risos e dentadas para que me levasse sem questionar nada...

"Elas tocam na ferida e delicadamente desvio o assunto. Queria contar sem ter de abrir a boca. Quero compreensão ou um eventual conselho mas não quero ter de explicar..."

Sinto o seu respirar pelas minhas costas abaixo. A barba mal feita arrepia-me e os beijos elevam de novo a temperatura da minha pele.

"O assunto morre por mais alguns minutos, as atenções desviam-se para outra pessoa e eu aproveito para confirmar que o teu silêncio se mantém."

As suas mãos magoam-me os braços e enquanto lhe marco o pescoço apercebo-me que não sei o seu nome...

"Calo-me, prefiro calar-me e organizar os meus pensamentos, o assunto vai voltar e eu tenho de saber o que vos dizer."

A noite escorre por entre os nossos corpos suados. Há muito que deixei de saber que dia é hoje e que me deixei levar pelos impulsos. Uma boca curiosa explora-me num silêncio que eu quebro em incoerências ocasionais.

"Finalmente decido responder. A verdade, ou o que me deixarem dizer da verdade... mais um golo de coragem e mais uma nuvem deixada por um cigarro mal aceso."

Fui escrava e meretriz, fui a sua rainha e passei-me por donzela nos quatro cantos do seu mundo. Fui amante insaciável e deixei-o adormecer ao meu lado. Fui fantasia silenciosa enquanto saí de mansinho, já o sol espreitava bem acima das telhas.

"Contei-vos sobre os dois lados que me consomem. Expliquei, o melhor que sabia, o quão dilacerados estavam os meus sonhos de nós. Contei ao detalhe sobre as saudades que sinto de me rir contigo, falei por tempos infindos acerca das ideias que trocámos, sobre a antecipação, as promessas veladas e todas as vontades que nos uniram por tão breves momentos..."

Antes de seguir para casa, parei para tomar o pequeno almoço. Não tinho fome mas o corpo fraquejante indicava-me que eram horas.

"No fim surge a pergunta crucial, respiro fundo... não, ontem não fui ter contigo. O teu silêncio empurrou-me para os braços de um desconhecido, mas nem disso te posso culpar"

Não, não fui ter com ele. Não, não sei o nome do outro. Não, não gravei nenhum número dele nem lhe dei o meu.

"De repente o outro lado veio ao de cima. Porque por um momento não quis saber de nada, e alguém serviu de escape para tudo o que eu não te soube dizer."

Fiz de alguém a imagem do que poderia ter sido contigo. Deixei-o levar-me com a confiança que teria sido tua e fantasiei contigo.

"Foi uma espécie de despedida silenciosa que projectei no corpo de outro qualquer. E hoje, tu és mais um contacto mudo numa lista e o outro é o êxtase sofrido nas horas da mais sóbria loucura que me acompanhará por muito tempo."


segunda-feira, outubro 13, 2014

Se te soubesses indesejado, ficavas?

Se a tua infância fosse um retalho de imagens da felicidade alheia, permanecias?

Se te revisses em cada defeito do mundo, paravas?

E se nada em ti fosse suficiente, e ninguém te pedisse para que não fosses, aguentavas mais um dia?

E se respirar te matasse de mansinho, sorrias?

E na ausência de opções, qual seria o teu próximo passo? Isolavas-te, ou corrias?

Todos somos assombrados, por um, ou vários demónios, medos ou inseguranças, traumas ou apatias, mas o que fazer quando é de ti que tens medo?

Para onde ir quando estás encurralado na tua própria garganta?

Como continuar a ser? Rir? Amar?

Se à tua volta todos encaixam mas tu és rejeitado por seres diferente num embalagem como as outras.

Porque para ti qualquer nada tem de servir e porque sabes o que pensam, ou o que sentem, sem que nenhum gesto esteja lá para confirmar.

Será que vales a pena? Não serás apenas mais um que vai sobrevivendo?

Um desperdício de espaço, um entrave em tantas vidas?

E se ao final de dias de silêncio ninguém te procurou, perguntas-te o que fazes aqui? Ou bebes mais um copo na esperança que amanhã seja melhor?

E se deixasses de ser, será que o mundo sorria? Ou, como os restantes, não dava pela pequena ausência?

E se o mundo acabasse hoje, quem é que ia querer estar ao teu lado para dizer adeus?

sexta-feira, setembro 12, 2014

"Se fosse fácil ser, a ausência de desafios levar-te-ia ao desespero.
Se fosse justo, qualquer um encararia a vida de cabeça erguida.

Se fosse lógico... se ao menos fosse lógico...

Não sei, nem sei se quero saber, a procura incessante por algo mais, a insatisfação nas poucas simplicidades ao meu redor, a tristeza que impera nos dias. Tristeza essa, que nem sei se de tristeza se trata, apenas um nada qualquer que me leva a ponderar os propósitos.

Se ao menos fosse linear...

...não sei. Essa expressão que impera neste império vão, é de facto uma resposta válida na nossa ignorância diária, às vezes rasgada por momentos alucinados de uma clareza quase pura, e mesmo desses, nada sei.

Às vezes superior a tudo isso, num riso despreocupado, vivendo pequenos instantes e sugando-lhes um êxtase absurdo que não consigo explicar. E depois? O ridículo de vidas vividas em rotinas cansativas, que desesperam quem as vive, quem não tem alternativa, porque a rotina já não é uma escolha, é um trilho tortuoso e obrigatório.

Se ao menos conseguisse explicar...

Queria trazer os meus fantasmas e mostrar os meus porquês, ou, na impossibilidade do absoluto, um ou dois dos meus porquês. Mas queria-o sem consequências, apenas compreensão silenciosa, mas...

(entrelinhas?)

Vai ficando nas entrelinhas esquecidas, e vou levando a minha ausência de rotina, um dia de cada vez.

Não sei ser diferente, não sei explicar, não consigo ser melhor e também não quero ser pior. Não adivinho o futuro e não me deixam mudar o passado. Talvez tenham sido só sonhos menos bons, criados pela fertilidade da minha imaginação cansada pelo cinzento dos dias.

Se ao menos eu soubesse alguma coisa, esta ignorância frustrante de saber que há algo, que tens a capacidade de compreender, mesmo ali à frente, mas não tens um único vislumbre do que se possa tratar.

Se ao menos fosse coerente... Talvez eu não fosse eu, e se assim fosse, quem o seria por mim?"

Os minutos continuam em pequenos nadas, gestos mais ou menos significantes que preenchem aquele cantinho aconchegado. Motivos egoístas? Talvez. Não sei ser o que esperam que eu seja, nem conheço forma de transmitir o que tudo isto significa. Não sei contornar os obstáculos sem os compreender, e a intuição (será esta a palavra?) leva-me a atitudes iguais a mim.

E se ao menos isto fizesse sentido, não ficaria este amargo no ar, ou no papel, ou naquele cantinho aconchegado, que só e sei onde fica...

domingo, agosto 31, 2014

...

Num mundo que parece girar à velocidade da luz, ser sensível é tão pior que ser invisível.
Interpretada como fraqueza, talvez até por mim... ou principalmente por mim, a sensibilidade é o defeito que acaba por me consumir.
À minha volta observo as falsas fragilidades usadas em jogos de sedução. Não consigo ser o que não sou, e não escondo a independência que faz de mim quem sou. Não sinto necessidade de gestos grandiosos, de ajuda, ou de cavalheirismos forçados e banais. Não sou frágil, sou resistente, sou independente e orgulhosa, sou forte e sou feroz. Mas sou humana. Há palavras, olhares e risos que me magoam. Desatenções que dilaceram dias de felicidade, friezas que me congelam e endurecem.
Uma vez mais, escondo-me em piadas fáceis, banalidades, frases feitas e senso comum. Deixo-vos ver apenas o que é bom de ser visto, e quando as coisas se aproximam de um qualquer limite, sai alguma dor, no tom de uma queixa trivial, para afastar um bocadinho o ponto de ruptura, deixando o resto escondido de novo.

Sinto-me um miosótis escondido atrás da grande muralha da China. Algo simples e frágil, de tal forma, que não sei se vale a pena atravessar um obstáculo tão difícil para lá chegar. Sim, insegura. Há tantos anos incerta acerca de mim mesma. Assombrada por defeitos que não consigo contornar, não sei se vale a pena tentarem ver o que escondo. A muralha foi contruída por mim, e não me restam forças, ou vontade para a deitar a baixo. Também não tenho capacidade para me fazer ouvir e torno a não saber se quero que me oiçam. É esta necessidade masoquista de me sentir diferente.

Algures existem pequenas esperanças, nalguns abraços, em beijos furtivos, em palavras meigas que me vão chegando, em pequenos nadas dos dias bons.

De repente tudo muda. Porque não me percebes acabas por me magoar com um gesto bem intencionado. porque não compreendes os meus motivos, a minha timidez, os medos ou as inseguranças. Porque em tantas coisas que são impossíveis de explicar, é necessário um entendimento intuitivo e silencioso para perceber. E hoje, quando a informação corre à velocidade da luz, o mundo está sempre a correr, e eu permaneço escondida, tu não me consegues ver, ou ouvir, ou sentir.

Uma brisa sopra gentilmente e agita-me ligeiramente. Levanto-me sem vontade, cedo a mais um incentivo. Saio, rio-me, e algo em mim aproveita uma noite, o resto permanece agarrado ao chão longínquo, atrás de pedras milenares que não são minhas, mas que carrego como se fossem.

"Tu" és um pronome impossível. Um não sei quem, não necessáriamente no sentido romântico da vida. Este "Tu" poderia ser uma das muitas pessoas que preenchem a minha vida, um animal de estimação, ou um objecto adorado. Todos igualmente reais, e igualmente incapazes de reconhecer que sou é contruída por uma sussesão de multiparadigmas voláteis. Que tudo muda, que a biologia em mim me leva a ser inconstante, a dar ares de incoerência, a ser muito mais que a soma das partes que me constroem. Sou igual a ti, mas sou diferente. Sinto as coisas de uma outra forma, escondo-me atrás de barreiras diferentes. Cada uma das minhas partes é igual à de milhões de outras pessoas, mas a soma delas, é algo indfinível.