Procurei as minhas palavras no pulsar tímido do ponteiro dos
segundos. Esquartejei todas as que encontrei perdidas por ali, a maioria vinham
de um passado qualquer em que a dor e a incerteza eram o prato do dia.
Sinto-me ingénua, banal, quase infantil. Como foi possível
ter-me deixado sentir assim? Deixar-me ser uma, entre tantos milhares de
pessoas que se sentem da mesma forma, perante as mesmas circunstâncias? Sei-me
diferente, e no entanto afundo-me nos mesmos erros dos restantes pedintes de
carinho com quem me vou cruzando.
Não estamos todos à procura de alguma coisa?
Não estou, também não deixo de estar. Vou olhando em volta,
mas numa espécie de desdém incontrolável. Talvez seja mais o instinto de ver as
montras do que a vontade de adquirir seja o que for.
“Eu falei, mas tu não quiseste ouvir…”
Tu avanças e eu recuo. De ti não quero mais do que o passar
das horas acompanhada por uma respiração que não seja a minha. Não me importo
que não fales, se calhar até prefiro assim. Não quero que te juntes a mim nos
meus debates filosóficos, não quero que sejas sequer capaz de compreender os
meus pontos de vista rocambolescos. Quero que estejas ali, como uma peça de
decoração do meu dia, da qual eu tirarei proveito sempre que me apeteça, e sem
me preocupar se a deixei no sítio, ou se ela cai ao chão e se parte.
“Eu falei, mas tu não quiseste ouvir…”
Repugnância por esta minha atitude desprendida… Não que de
facto faça algo errado, simplesmente vejo-te afundar numa espécie de areia
movediça, e não te consigo alertar de outra forma.
Mais um minuto.
Agora quero-te, mas daqui a um instante
podes ir embora. Não percebes, porque não quiseste ouvir, mas não te quero, não
por mais que um minuto.