quarta-feira, abril 30, 2008

Ancorada ao vento

E sem vida me deixo estar, ancorada ao desespero do vento que corre na direcção das montanhas estridentes, balançando ao sabor dos nadas que vão preenchendo os segundos imparciais.
Agarrada a um quase nada que deixou de ser e me deixou com marcas irreparáveis. Mudanças despropositadas que vieram virar a minha atenção para outro lado qualquer. Abanões incoerentes em desabraços clandestinos que me transformaram numa brisa desassossegada e cheia de coisas que não consigo demonstrar.
Uma qualquer coisa que vai passando pelos tudos da tua vida, sem se fazer notar, porque nada mais interessa senão que tu saibas.
Porque me mudaste, e me habituaste a ter-te sempre ali, e agora sou como qualquer criança incapaz de aguentar sequer a cabeça direita.

Caminho de olhos no chão, porque o céu está demasiado longe, e o chão está já aqui, ao alcance de um pé mal colocado, ou de um desajeito infeliz.

Foste o que foste, e eu fiquei o que não era, como a brisa que se gela ao chegar às montanhas, ou como a chuva que se evapora ao chegar a mim. O calor que me constrói as saudades de horas suadas nas tuas mãos.

O ruído que me acalma os sentidos, porque abafa o que resta das palavras que te gritei quando virei, a música compassada de um coração insípido que bate sem querer, os murmúrios de sonhos indesejados que vêm com um convite por escrito. O desejo imenso de me livrar de ti, mesmo sabendo que és a vida que me preenche os recantos deixados pelas lágrimas, o cansaço deixado pelas lutas entre ti e os meus pesadelos.
A vontade de ser outra coisa qualquer, para deixar de ser esta lua a orbitar apenas ao redor de um buraco negro, só para te poder dizer que um dia estive certa… que tudo muda e tudo acaba, até os para sempre gritados por entre os devaneios da loucura.

sexta-feira, abril 25, 2008

Na tua Ausência

À noite quase me consigo esquecer do teu rosto, aconchego-me em frente a um filme a acabo por adormecer sem pensar em ti, as horas passam, e eu durmo tranquilamente.

Mas o dia chega sempre cruel...
Hoje quase te senti a caminhar ao meu lado, a tua mão a procurar a minha insistentemente, e eu a fugir, rindo-me como uma criança traquina. Porque procuravas sempre a minha mão, e eu fugia sempre para te provocar. Senti o teu respirar no meu pescoço, os teus beijos suaves e fugazes. Senti a tua presença e tive saudades.

Senti o sabor do teu beijo, ainda sinto. O roçar ansioso dos teus lábios na busca pelos meus, aqueles beijos fogosos e demorados que sempre me faziam render. Baixei as defesas e deixei-te aproveitares-te de mim, uma última vez. Sonhei acordada pelas ruas cheias de gente desconhecida.
Nunca estivemos juntos aqui, e no entanto consigo construir memórias nossas como se tivéssemos estado. Cada passo, cada conversa, cada tema de que poderíamos falar, cada resposta que poderias alvitrar. Virei a cabeça várias vezes para ver se estarias aqui, para criticar alguém que passava, ou para te perguntar se querias parar e tomar algo.
No meio daquela multidão, o teu rosto não surgiu uma única vez. Senti-te. O teu corpo apertado contra o meu no metro apinhado, os teus atrevimentos brincalhões no meio daquela gente toda, os meus sorrisos, as tuas gargalhadas… eu a reclamar do calor, e tu a chegares-te mais a mim buscando a minha pele fresca, as discussões amenas e propositadas que nos davam mais um motivo para um beijo, como se precisasses de um motivo para me beijares.
O teu gesto habitual de me desviares o cabelo dos olhos, os cuidados gentis, os hábitos que estão a custar a passar.
Em casa continuei a ver-te em todo o lado, fizeste-me cócegas enquanto estava a cozinhar, e eu abracei-te por trás enquanto lavavas a loiça, e terminamos cheios de sabão e molhados até aos ossos. Tomámos um banho demorado juntos, terminei com uma massagem nas tuas costas perfeitas e deixei-me adormecer assim, encostada ao teu corpo desnudo e embalada pelo teu respirar pausado.
Sonhei o dia todo, e cada imagem foi uma facada nas memórias que tenho tentado esquecer. Já não te quero comigo, mas tenho saudades de te ter. Sou uma incoerente, uma insatisfeita! Não te quero, mas em dias como hoje, quando a tristeza bate à porta e as horas parecem não passar, sinto a tua falta, porque descobrias sempre uma maneira de fazer o tempo passar mais depressa.
Será que ainda sentes o cheiro do meu cabelo acabado de lavar? Que tens saudades das minhas brincadeiras? Será que ainda conheces os meus gestos de cor? Que ainda sonhas comigo? Que ainda queres ver o meu rosto todas as manhãs? Será que ainda és a pessoa que conheci?
Será, que ainda te lembras de como era sermos nós?

quarta-feira, abril 16, 2008

Esta espécie de não-sei-quê

Como poesia esvaída em lágrimas pelas folhas fora, sem saber porquê. Um sentimento contraditório que me leva a ter atitudes inconsequentes, a agir sem pensar, porque se pensasse seguia outro rumo, para longe de ti. Uma espécie de quase nada, que afinal é mais, e me vai dominando pouco a pouco sem eu me aperceber. Um instante impensado que me leva a confessar tormentas há tanto escondidas nos recantos mais improváveis.

Porque agora sabes quem sou, agora vês-me sem te aperceberes, e mais uma vez tento esconder-me em risos inocentes e palavras banais.

Porque te quero de volta, sem saber sequer se te quero, nesta espécie de sentimento por definir, que vem ora de mansinho, ora em avalanches de lágrimas despropositadas.

Arrebatam-me os pesadelos, e acordo agitada a meio da noite à procura do teu conforto, e acabo abraçada à almofada que me vai acompanhando, fiel à sua função.

É esta espécie de não-sei-quê que vai ditando os meus passos, como se eu não tivesse vontade própria, como se tivesse deixado isso tudo, e muito mais quando me vim embora.

É esta espécie de maneira de ser que me faz fraquejar perante um sorriso teu, e me faz tombar inconsciente perante uma lágrima tua.

Querer-te sem te querer, porque não controlo o meu corpo, e não controlo os meus pensamentos, porque parece-me que os deixei contigo naquela noite em que tudo foi dito, e nada mais sobrou.

É esta espécie de amor por definir, que faz de mim criança novamente, em busca de um amigo com quem brincar, e de um colo, onde possa chorar sem vergonha.