Estar assim, neste misto de nada, fundido com a tristeza
profunda que se espelha nos meus olhos de vez em quando. Tristeza, que talvez
nem seja tristeza, talvez apenas uma desilusão difundida no mais profundo do
meu ser.
Apaziguo tudo com sorrisos longos, gargalhadas sonoras, com
entreténs, descartáveis como tu, que vão preenchendo alguns vazios dos dias. Alguns
apenas, porque os outros tenho-os reservados para mim, para este eu que de vez
em quando me chama.
Metáforas e sarcasmos vão desviando os temas das conversas
para o tampo da mesa, onde esse cinzeiro quase cheio nos centra, e levam-me a
ti. Por um segundo apenas, tu. Que és pouco mais que o tapete que tenho à porta
de casa.
De fundo, uma música violenta. Não sei o que dizem, não
tento sequer perceber o que sentem, as suas palavras são tão irrelevantes como
tu, são apenas mais um pedaço que preenche o meu espaço quando eu quero.
Trazem-me os ritmos de outras gentes, e abafam o ruído da rua.
Não te conheço, não te quero conhecer, não gosto de ti, nem
quero aprender a gostar. Regozijo-me no meu egoísmo de te poder escolher como distracção
de algumas horas. Não me dei ao trabalho de te tentar explicar nada. És de
facto quase irrelevante, e espero que saibas disso.
Quase cruel, deixo que descubras o caminho da porta, porque
nem isto é sobre ti. É sobre mim, como sempre foi, neste meu egocentrismo
encantador. Para mim, porque permaneço o centro na minha vida.
São pensamentos de horas vazias. Nem tudo o que digo, penso
ou transmito num momento será verdade uns segundos depois. Eterna insatisfeita,
incoerente, quase imbecil nesta tentativa vã de exprimir o que for. Talvez seja
apenas a necessidade de gritar algo bem alto… não sei o que será, senão esta
folha estaria bem mais branca.
Somos todos descartáveis na vida uns dos outros. Do centro
de uma vida passamos a suave lembrança, eventualmente agitada por episódios
marcantes. Quem hoje me acompanha por horas infindas, amanhã será um contacto
numa lista, que por circunstâncias mais ou menos simples, raramente é usado. A
vida atravessa-se nos nossos pés, e no meio da confusão há sempre quem fique
para trás.
Acendo mais um cigarro, este meu fiel companheiro,
mais cruel que eu. Nada disto faz sentido… melhor assim, não fosses tu tentar
perceber o que te estou a dizer, e de descartável passavas a outra coisa
qualquer.