quinta-feira, novembro 27, 2008

Medo

"Quando o sol se afasta as criaturas saem à rua. Despem os seus ares compenetrados de profissionais competentes e revelam o seu ar sombrio e ameaçador. Claro que talvez os olhos do observador sejam um factor determinante no processo, mas a verdade é que à noite todos somos desconfiados, todos estamos prontos a atacar à mínima ameaça, somos carnívoros vorazes e impiedosos.
A rua serve de palco, às janelas os espectadores impassíveis e dos becos escuros saem os actores principais que fazem espectáculos de movimentos bem estudados. Vou por aqui que há mais luz, vou agora, vou mais tarde, vou de carro e tranco as portas, vou a pé mas com um x-ato no bolso (sim, porque uma dessas armas mortíferas vai ser fácil de abrir em caso de perigo!), ou pelo contrário, escolhem os caminhos mais recônditos, sem luz, sem gente, por onde caminham os gatos vadios e onde apenas circulam artistas como eles.
Estamos num mundo cão, e fazemos dele pior do que realmente é. Qualquer de nós no ambiente apropriado seria um assassino impiedoso, um traficante de droga, um ladrãozeco de esquina. Qualquer um de nós, que tem polegares "oponíveis" aos restantes anõezinhos é capaz de uma atrocidade qualquer, e num dia comum, temos mais medo da pessoa que está sentada ao nosso lado no metro que um uma fera da savana Africana.
Máquinas infernais de capacidade intelectual muito variável. Artistas insensíveis ou brutamontes lamechas, o resultado é sempre o mesmo... MEDO! Temos medo de nós mesmos, temos medo de morrer, temos medo do escuro, temos medo da dor, temos medo... "Quem tem medo compra um cão!", e há muitos a precisar de um lar no canil municipal! Ou também tens medo de cães?
No fim desta merda toda, 99% das pessoas tem medo é de viver. Ponham lá o x-ato no bolso, olhem de lado para a pessoa que se senta ao vosso lado no metro, se for assim um senhor mal vestido e com mal aspecto mudem de lugar. Sejam rudes e isolem-se, magoem lá a pessoa que se fica a sentir mal porque todos têm medo dela e não se preocupem. Afinal não estão a fazer mal a ninguém... certo? Não espetaram uma faca no peito dele, nem lhe apontaram uma arma à cabeça, só o fizeram sentir-se mal por um bocadinho, e foi em auto-defesa!
Hipócritas!
Compreendo mais depressa um miúdo de 10 anos no meio da guerra com uma espingarda na mão que a vocês, pessoas ditas civilizadas, que fogem de qualquer conceito que vos faça Humanos."

segunda-feira, novembro 17, 2008

Fotografias

Algo que me faz lembrar dos bons momentos que estão pra trás...








e que me dá a certeza de que as coisas melhoram, a cada dia um pouco mais.

quarta-feira, outubro 15, 2008

Numa noite como outra qualquer, seguraste-me o rosto e pediste-me um beijo. Nessa mesma noite, que poderia ter sido outra qualquer, os beijos foram os protagonistas do conto de fadas que me prometeste.
A noite correu naqueles sofás que juntaste apenas para poderes dormir ao meu lado, na ingenuidade de que algo maravilhoso poderia acontecer. A timidez levou-nos ao disfarce e o segredo tornou-se nosso aliado.
Foste o príncipe encantado que apareceu montado num cavalo ruço, tão comum, tão inesperado, tão simples.
Numa noite, como outra qualquer, montaste o cenário perfeito. As velas acesas apenas permitiam vislumbrar os contornos do teu sorriso, tinhas espalhado chocolates por cima de uma cama improvisada, a música abafava os sons que chegavam do resto do mundo e os teus gestos levaram-me a acreditar em utopias longínquas.
Foste o amante insaciável que me mostrou os becos escondidos de um sonho.
Um dia percebi que esse sonho não era real, que os meus medos te afogavam em desespero, que a minha timidez te ia matando um pedacinho de cada vez, que os meus sorrisos eram poucos, que as minhas lágrimas traziam um passado demasiado longo para que tu me pudesses salvar de mim mesma.
Um dia, como noutro dia qualquer, saíste pela porta e nunca mais voltaste.
Nesse dia, ou noutro dia qualquer, coloquei tudo numa caixa de cartão e deixei que esta fosse levada pelo tempo.
Um dia sonhei que me tinhas jurado amor eterno e que era eu quem tinha fugido a correr.
Nós fomos feitos de dias assim. Hoje, quando esses dias estão tão distantes, sei que foi tudo um sonho, porque contos de fadas só no papel.
Naquele dia, tão banal como os outros, pedi-te um beijo e disse-te adeus.

terça-feira, setembro 09, 2008

Guerra dos mudos


Os dias correm-te por entre a amargura de uma vida repleta de desilusões. Agarras-te com força ao que tens, com medo de cair em algo que desconheces, e vejo as tuas lágrimas choverem por entre sorrisos azuis.

Agarrado a algo que há muito deixou de ser, mas por imposição das aparências manténs bem firme, procurando que amanhã seja diferente de hoje, esqueces-te apenas que diferente nem sempre é melhor.

Amanhã chega, e o ontem bate-te com a porta na cara quando o tentas fixar nos olhos. A oportunidade foi-se embora, e o teu silêncio impera nesse teu reino tão pequenino.

És mais, és tão maior que um gigante Liliputiano resignado a essa guerra feroz entre dois mudos que outrora foram amantes.

Talvez as palavras que vais deixando sair em tom de apelo sejam suficientes, e os poucos olhares que derramas complacente nesse teu refúgio sejam suficientes, e os amores quase platónicos que sofres sejam suficientes… talvez.

A gentileza dos teus gestos devia ser permanente, sabes? Devias olhar um pouco para ti, e descobrir de que cor querias pintar os teus dias, para cobrir esse sépia envelhecido que vais deixando a cada passo.

Os teus bolsos são demasiado fundos, e esses nadas demasiado pesados.


Mais uma chance, só mais uma, de mil que estão p’ra trás, e mais mil que estão pela frente, e a vida vai-te passando pelas mãos sem teres tempo de a chegares a viver. Mais uma batalha, com silêncios de espada em punho, e olhares de caçadeira nas mãos.

Mais uma hipótese, as coisas mudam, vai ser diferente, quando no fundo também não acreditas nessa mudança, e de cada vez que sorris, os castelos derretem e naufragas novamente deitado na tua própria cama.

O amor há muito passou a memória, a memória há muito passou a ódio, e o tempo… há muito que apenas passou.



Entre o ódio e o amor, existe um espaço muito cómodo a que chamaram casamento. Talvez o leves demasiado a sério, talvez os outros o levem demasiado a brincar... talvez, e apenas talvez, mais uma chance te leve para o lado errado desse abismo que vos une.
Mas como sempre, cá estarei.

segunda-feira, setembro 01, 2008

Bruma Nocturna

E descobrir que estou a correr há tanto tempo apenas para ficar parada no mesmo sítio.
Olho o céu onde deixaste cair tantos pingos de lixívia e tento encontrar um padrão, mas ele está desfocado pelas cinzas do vento. Ao redor apenas uma brisa aconchegante, tudo o resto foi levado para a estratosfera de um planeta que nunca cheguei a ver. As circunstâncias ensinam-me a dançar o tango, termino exausta e sem forças, sem vontades. Esgoto as conversas com o copo, agora vazio, procurando no seu interior algo que me diga se o devo voltar a encher… talvez não.
Sento-me num chão qualquer, pernas esticadas e mente encolhida. Os pensamentos taciturnos vão-me fazendo festas no cabelo e eu afasto-os com as minhas mãos pequenas, que vão agarrando os pensamentos alegres que insistem em contar-me anedotas novas, deixando-me a sonhar com mundos de outras cores, a sorrir com lábios de outras gentes, a viver com o coração que roubei do livro de histórias de uma criança pequena.
Sou assim, vulto esbatido pela borracha de um disco voador que avança sem rumo e sem pressa. Alegre de ser, sem saber se de facto vivo ou se apenas me deixo viver.
Ainda sinto o latejar das cicatrizes profundas deixadas pelos vidros partidos nas minhas mãos, ainda insisto em apostar a minha vida em jogos irresponsáveis, sabendo que saio sempre ilesa, ninguém arrisca a minha vida, como se ela tivesse algum significado além de mais um pulsar ritmado pelas colunas estéreo que acordam os vizinhos.
Bebo mais um golo do copo que voltei a encher, o suave torpor do álcool vai tomando conta de mim, levando-me a escapar maleável por entre os vossos dedos, e mesmo debaixo dos vossos olhos.
Refugio-me uma vez mais nos braços da noite, longe de toda a vida, onde sei que ninguém me encontra. Incontactável no meio de brumas passageiras, irresponsável pela preocupação que rasteja atrás de mim, sem pensar, sem sentir. A minha mão escondida debaixo da minha cabeça, amparando-a e dizendo-lhe o caminho que o meu olhar deve seguir, na direcção das estrelas cadentes que passam ao meu lado, tentando-me a pedir-te como o meu próximo desejo. Resisto, uma vez mais e solto risos nervosos ao lembrar-me daquele beijo, última tentação fugaz induzida pelas saudades pulsantes nos nossos olhos.
Capricho meu, tentar fazer-te lembrar o bom que era estarmos lado a lado.Convenci-te que foi só uma brincadeira maliciosa do destino, que nos quis separar da mesma forma que nos tinha unido.
Caiu mais uma estrela no momento em que eu fechei os olhos para te saborear uma vez mais, deixando-me levar pelas folhas que dançavam ao sabor dos meus suspiros e sorrindo deixo-me morrer, agarrada aos delírios que tinhas deixado espalhados ao meu lado.


terça-feira, junho 03, 2008

Contos de fadas

Acordada pelos pássaros azuis que poisaram na minha janela esta manhã.
Debaixo de mim o lençol respirava pausadamente, sem se aperceber do tumulto que se passava ali ao lado. Encostei-me mais ao cobertor estremunhado e perguntei-lhe as horas, ao que entre dentes me respondeu “é cedo…”.
Levanto-me sem fazer barulho e sento-me na cozinha. O dia só agora começa a despontar por cima dos prédios preguiçosos, que nunca se deviam para eu ver as montanhas geladas.
Encho-me de coragem e ponho-me a trabalhar, mas as folhas parecem desviar-se do caminho das minhas mãos. O telefone continua calado, as horas vão pingando taciturnas pela torneira mal fechada. Falta pouco, e no entanto parece uma eternidade, os momentos correm, distraídos pelas minhas veias envenenadas, o café fumegante preenche o ar sem pedir licença, acostumado a este ritual diário.
Uma vez mais sei que estás aí, que me observas de longe, do alto da tua imaginação, adivinhas cada movimento, calculas cada sopro de respiração forçada, marcas o compasso de cada batida do meu coração sem nunca te mostrares. Imaginas os arrepios da minha pele e regozijas-te quando lês os meus pensamentos.
Olho pela janela mas não te vejo, sei que estás aí, mas não à vista. Fecho a janela e sem fazer ruído volto à cama adormecida. Viro-me de um lado para o outro mas a almofada ressona, não me deixando dormir.
Volto à sala gelada, e ponho um filme lamechas. Choro sem saber porquê e acabo por me deixar adormecer ali mesmo, num sofá apertado e desconfortável.
Ele não gosta de mim, desde que lhe derramei café em cima, nem a palavra me dirige, é o castigo que me dá, pelo desajeito crónico que me ataca todas as manhãs.
Pouco me importa, não é com ele que eu quero falar, queria ouvir a tua voz, nem sei o que tinha para te dizer, mas a tua atenção ia ser um prémio merecido, pela minha paciência de te esperar há tanto tempo.
Já gastei a saliva, e todas as minhas palavras fazem tanto sentido como aquela música que falava de príncipes e de montanhas de puré.
Somos parvos, eu e tu. Evitamos o que já por si é impossível, como se fosse esse o único propósito de estarmos aqui, nunca vamos falar, esse conto de fadas que estás a construir à volta dessa princesa que nunca viste, vai-se desfazer em fumo, e vais acabar casado com alguém que há de te amar como eu nunca seria capaz.
Vais sentir esse vazio para o resto da vida, mas nunca vais saber porquê. Um dia deixas de sonhar comigo, e eu hei-de voltar a controlar a minha respiração, seguir os dias como antes, na busca de algo que nunca chega, neste vivência pacífica de dias sempre diferentes, nestes desastres que acabam por me levar à solidão. Agarro-me como posso, a tudo o que é, deixo o passado escapar-me da vista e construo novos sonhos, novas memórias, novas amizades.
Mas sinto a tua presença, mesmo sabendo que não estás aqui, saudades da tua voz, que nem sei a que soa, necessidade do teu abraço, que nem sei bem se existe.
Durmo nos braços do sofá e os sonhos cessam de repente, deixam um grande vazio, terminado pelo sol que me queima as faces e me chama de volta para a realidade.



A esse alguém, que um dia há de vir...

quarta-feira, maio 07, 2008

Fragmentos

Vi as tuas lágrimas serem levadas pelo rio de palavras que iam sendo ditas pela noite dentro. Brilhavam como pirilampos e voavam para longe de nós sem deixarem rasto. A noite caminhava de mãos dadas com a amizade improvisada em cima dos joelhos do vento quente, as conversas sucediam-se e proliferavam na madrugada que possuíamos, não pediam licença, e iam deixando marcas coloridas nos nossos rostos, como se a sua missão fosse fazer-nos felizes naquele fragmento de luz opaca que balançava à nossa volta.
Cúmplices desinteressadas que se uniram por um acaso premeditado pelo sol em conspiração com o balançar suave das ondas estáticas que nos faziam levitar acima das nuvens e além da compreensão humana.
Nem eu sei o que aconteceu naquela noite, fui preenchida por um sentimento de compreensão, pela vontade de dizer mais mil palavras, de ficar mais mil horas ali, sem nada mais que o desenvolver natural de conversas e filosofias, de risos e lágrimas doces, de nos despirmos de pudores sociais quadrados e vestirmos a pele de gente de outros tempos, de sonhadoras e descrentes ao mesmo tempo.
Fui o anjo que te deu colo, fui mensageira daquelas horas há tanto esquecidas e que nos marcaram para sempre. Foste e és parte do porto seguro para onde eu volto sempre, e eu sou a ponte entre o pretérito imperfeito do que fui, e o futuro mais que perfeito que pretendemos alcançar.
Foram conversas de meses inteiros atiradas para umas horas intensas de prazer verbal, de pureza assegurada pelas mentes atordoadas pela surpresa do que estava a acontecer.
Fui “eu” para “ti” naquele fragmento de espaço sideral que nos abraçou com força, e foste futuro pulsante nos sonhos há tanto abandonados.
Unidas por um pedaço de céu negro, rasgado pela luz da lua incógnita e pincelado por dedos carregados de saberes intensos.
Fomos Platão e Sócrates discutindo o existencialismo das estrelas entrançado com a voracidade das ondas do mar ali ao lado. Fomos alcançadas pela sabedoria do que já não é, e pela futilidade do que poderá vir a ser, assoberbadas por cartas de amor que nos chegavam de outros ares, e por risos conjuntos de compreensão absoluta.
E é de conhecer-te assim como a mim mesma que se constroem os risos e lágrimas explicadas apenas pela intuição certeira, e é dos perdões que não têm que ser pedidos que se mantém esta qualquer coisa em nós. Porque somos e seremos sempre, mesmo que o tempo te leve para longe, parte uma da outra, neste sentimento que não tem que ser definido nem explicado, simplesmente porque a sua ingenuidade sincera e inócua faz dele superior ao universo dos sentimentos mundanos.
=) Sabes quem és, *** To the moon and back one thousand times!

quarta-feira, abril 30, 2008

Ancorada ao vento

E sem vida me deixo estar, ancorada ao desespero do vento que corre na direcção das montanhas estridentes, balançando ao sabor dos nadas que vão preenchendo os segundos imparciais.
Agarrada a um quase nada que deixou de ser e me deixou com marcas irreparáveis. Mudanças despropositadas que vieram virar a minha atenção para outro lado qualquer. Abanões incoerentes em desabraços clandestinos que me transformaram numa brisa desassossegada e cheia de coisas que não consigo demonstrar.
Uma qualquer coisa que vai passando pelos tudos da tua vida, sem se fazer notar, porque nada mais interessa senão que tu saibas.
Porque me mudaste, e me habituaste a ter-te sempre ali, e agora sou como qualquer criança incapaz de aguentar sequer a cabeça direita.

Caminho de olhos no chão, porque o céu está demasiado longe, e o chão está já aqui, ao alcance de um pé mal colocado, ou de um desajeito infeliz.

Foste o que foste, e eu fiquei o que não era, como a brisa que se gela ao chegar às montanhas, ou como a chuva que se evapora ao chegar a mim. O calor que me constrói as saudades de horas suadas nas tuas mãos.

O ruído que me acalma os sentidos, porque abafa o que resta das palavras que te gritei quando virei, a música compassada de um coração insípido que bate sem querer, os murmúrios de sonhos indesejados que vêm com um convite por escrito. O desejo imenso de me livrar de ti, mesmo sabendo que és a vida que me preenche os recantos deixados pelas lágrimas, o cansaço deixado pelas lutas entre ti e os meus pesadelos.
A vontade de ser outra coisa qualquer, para deixar de ser esta lua a orbitar apenas ao redor de um buraco negro, só para te poder dizer que um dia estive certa… que tudo muda e tudo acaba, até os para sempre gritados por entre os devaneios da loucura.

sexta-feira, abril 25, 2008

Na tua Ausência

À noite quase me consigo esquecer do teu rosto, aconchego-me em frente a um filme a acabo por adormecer sem pensar em ti, as horas passam, e eu durmo tranquilamente.

Mas o dia chega sempre cruel...
Hoje quase te senti a caminhar ao meu lado, a tua mão a procurar a minha insistentemente, e eu a fugir, rindo-me como uma criança traquina. Porque procuravas sempre a minha mão, e eu fugia sempre para te provocar. Senti o teu respirar no meu pescoço, os teus beijos suaves e fugazes. Senti a tua presença e tive saudades.

Senti o sabor do teu beijo, ainda sinto. O roçar ansioso dos teus lábios na busca pelos meus, aqueles beijos fogosos e demorados que sempre me faziam render. Baixei as defesas e deixei-te aproveitares-te de mim, uma última vez. Sonhei acordada pelas ruas cheias de gente desconhecida.
Nunca estivemos juntos aqui, e no entanto consigo construir memórias nossas como se tivéssemos estado. Cada passo, cada conversa, cada tema de que poderíamos falar, cada resposta que poderias alvitrar. Virei a cabeça várias vezes para ver se estarias aqui, para criticar alguém que passava, ou para te perguntar se querias parar e tomar algo.
No meio daquela multidão, o teu rosto não surgiu uma única vez. Senti-te. O teu corpo apertado contra o meu no metro apinhado, os teus atrevimentos brincalhões no meio daquela gente toda, os meus sorrisos, as tuas gargalhadas… eu a reclamar do calor, e tu a chegares-te mais a mim buscando a minha pele fresca, as discussões amenas e propositadas que nos davam mais um motivo para um beijo, como se precisasses de um motivo para me beijares.
O teu gesto habitual de me desviares o cabelo dos olhos, os cuidados gentis, os hábitos que estão a custar a passar.
Em casa continuei a ver-te em todo o lado, fizeste-me cócegas enquanto estava a cozinhar, e eu abracei-te por trás enquanto lavavas a loiça, e terminamos cheios de sabão e molhados até aos ossos. Tomámos um banho demorado juntos, terminei com uma massagem nas tuas costas perfeitas e deixei-me adormecer assim, encostada ao teu corpo desnudo e embalada pelo teu respirar pausado.
Sonhei o dia todo, e cada imagem foi uma facada nas memórias que tenho tentado esquecer. Já não te quero comigo, mas tenho saudades de te ter. Sou uma incoerente, uma insatisfeita! Não te quero, mas em dias como hoje, quando a tristeza bate à porta e as horas parecem não passar, sinto a tua falta, porque descobrias sempre uma maneira de fazer o tempo passar mais depressa.
Será que ainda sentes o cheiro do meu cabelo acabado de lavar? Que tens saudades das minhas brincadeiras? Será que ainda conheces os meus gestos de cor? Que ainda sonhas comigo? Que ainda queres ver o meu rosto todas as manhãs? Será que ainda és a pessoa que conheci?
Será, que ainda te lembras de como era sermos nós?

quarta-feira, abril 16, 2008

Esta espécie de não-sei-quê

Como poesia esvaída em lágrimas pelas folhas fora, sem saber porquê. Um sentimento contraditório que me leva a ter atitudes inconsequentes, a agir sem pensar, porque se pensasse seguia outro rumo, para longe de ti. Uma espécie de quase nada, que afinal é mais, e me vai dominando pouco a pouco sem eu me aperceber. Um instante impensado que me leva a confessar tormentas há tanto escondidas nos recantos mais improváveis.

Porque agora sabes quem sou, agora vês-me sem te aperceberes, e mais uma vez tento esconder-me em risos inocentes e palavras banais.

Porque te quero de volta, sem saber sequer se te quero, nesta espécie de sentimento por definir, que vem ora de mansinho, ora em avalanches de lágrimas despropositadas.

Arrebatam-me os pesadelos, e acordo agitada a meio da noite à procura do teu conforto, e acabo abraçada à almofada que me vai acompanhando, fiel à sua função.

É esta espécie de não-sei-quê que vai ditando os meus passos, como se eu não tivesse vontade própria, como se tivesse deixado isso tudo, e muito mais quando me vim embora.

É esta espécie de maneira de ser que me faz fraquejar perante um sorriso teu, e me faz tombar inconsciente perante uma lágrima tua.

Querer-te sem te querer, porque não controlo o meu corpo, e não controlo os meus pensamentos, porque parece-me que os deixei contigo naquela noite em que tudo foi dito, e nada mais sobrou.

É esta espécie de amor por definir, que faz de mim criança novamente, em busca de um amigo com quem brincar, e de um colo, onde possa chorar sem vergonha.

sexta-feira, março 21, 2008

Licor de palavras


Beber as tuas palavras como se de um licor se tratassem. Um pequeno gole de cada vez, mordendo os lábios após cada um, para aproveitar cada gota, cada fragmento desse sabor que são as palavras ditas no teu discurso pausado. Sentir os arrepios do tom profundo da tua voz junto ao meu ouvido. O roçar da tua barba por fazer no meu pescoço. A emoção a tomar conta dos meus pensamentos, que me fazem balançar entre ti e a tua voz.


Crio uma realidade virtual à volta daquele instante, quando os teus lábios roçam o meu pescoço acidentalmente enquanto me ias sussurrar algo irrelevante, e a tua mão afasta os meus cabelos teimosos do meu rosto.


A tua mão tremia? Ou era eu? Ou era o licor a falar por nós?Deixei-me cair ali naquele momento, abandonada aos teus devaneios, entreguei-me a ti sem sequer me mover. A minha respiração parou, o meu coração abrandou perigosamente, e tatuei aquele momento no meu corpo.


A noite estava no fim, a sala estava cheia de gente, e nós tínhamos ali um espaço só nosso, em conversas transcendentes, em toques inocentes e tremores indesejados… A noite estava no fim, e eu tinha-te mostrado mais de mim do que aos meus amigos.


Eu não sei quem és, mas conheço-te.Talvez não te conheça, mas algo em mim sabe quem és, conheço o teu passado o teu futuro os teus planos e os teus sonhos, como se fossem meus.

Talvez não saibas quem sou, porque sonho sempre além daquilo que a realidade me permite, mas ali, naquela sala cheia de estranhos, senti-me única, porque foi ao meu lado que sentaste, e a tua atenção foi minha a noite toda, como se fosse realmente importante para ti estares ali comigo.


A noite estava no fim, e tu brindaste-me com um sorriso grandioso e um beijo na face.Os sonhos desfizeram-se, as luzes acenderam-se e as pessoas começaram a dispersar.

No fim, ficou o sabor das tuas palavras no meu ouvido, e o arrepio do meu pescoço na tua memória.


segunda-feira, março 17, 2008

Viro-me contra mim mesma… não posso fazer mais nada. Agarro-me ao que tenho, mas parece não ser suficiente. E tenho muito, mas não tenho o que procuro há tanto tempo.

Se morresse agora, havia muita gente a preocupar-se, a sofrer, a culpar-se… mas eu não, se eu morresse hoje, EU não me preocupava, EU não ia querer saber.

E revolto-me, porque sei quem sou, porque tenho um caminho traçado, e consigo percorrê-lo, apenas tenho pouca vontade de o fazer sem alguém ao meu lado. Porque me sinto destinada a viver sozinha, e isso magoa, arde, como pedaços de metal incandescente debaixo da minha pele… o meu coração vai batendo ao seu ritmo, e tudo o que eu quero é que ele pare, porque não me apetece estar viva.

Porque os passeios sozinha cansam, porque sinto falta das cumplicidades, de alguém que me diga todos os dias “ainda bem que estás aqui”. Eu não estou “aqui”, eu não estou em lado nenhum. Eu existo, uma existência surreal, silenciosa, calma. De quem aproveita tudo o que pode, mas não vive, eu não vivo, eu não consigo viver.

Revolto-me comigo, porque estou aqui, neste sonho, nesta perspectiva de futuro dourada, mas falta algo que lhe dê brilho, porque na minha existência eu não sou suficiente, e isso rasga-me os bolsos e deixa os projectos caírem por terra.

Encosto-me a uma parede qualquer e deixo-me escorregar até ao chão, cruzo os braços nos joelhos e desespero. Eu devia ser suficiente para mim mesma, mas não sou, e vou-me consumindo, em sorrisos, em boa disposição, em esforços sobrenaturais para acompanhar tudo, para mostrar a todos que está tudo bem… e está, porque estou bem, fisicamente bem, mas falta-me um pedaço de mim. Incompleta, e não gosto de me sentir assim. Eu sou, eu posso, eu faço. Arrasto mais uma perna para a frente, esboço mais um sorriso, evito pensar. Falta algo… não gosto de ser assim, não gosto de estar assim.

Já não me entrego, tenho medo, de deixar outro pedaço de mim com alguém, e ficar com outro buraco na alma… transformei-me neste animal desconfiado das sombras, nesta estranha que se olha de lado no espelho, com medo do que possa encontrar, transformei-me, e agora não há volta atrás.

Esmurrei-me de propósito, torturei-me, mas as lágrimas não querem vir, aquele lado sensível esvaiu-se, ou escondeu-se… sofro sem sequer conseguir sofrer, nesta apatia imperceptível, neste rancor manso, nesta existência artificial em que entrei, neste caminho triste de onde não sei sair.

13/03/2008


quinta-feira, março 13, 2008

Vendedores de Sentimentos

“What’s love but a secondhand emotion?”
E não é que ela tinha razão? Os sentimentos são todos assim, sentes, e entregas isso a alguém, vão em segunda mão, o original fica contigo, e só tu sabes o que ele significa na realidade, ele fica para sempre contigo. Entregas algo parecido, ou uma pequena parte daquilo que pensaste, que sentiste. Somos todos seres hipócritas e egoístas, o melhor fica sempre connosco, temos vergonha de entregar tudo, escondemo-nos atrás de escudos bem estudados de pessoas insensíveis, ou demasiado ocupadas para se preocuparem com essas lamechices de sentimentos, entregamo-nos aos pouquinhos, mas sempre bem escondidos, bem disfarçados de pessoas adultas que sabem controlar as suas emoções.
E depois?
Acabamos assim, feridos num silêncio abafado por gemidos de prazer fingido, que procurámos em pessoas tão hipócritas como nós. Porque nos recusámos a sentir, a amar de verdade, porque não queríamos dar tudo, com medo de não receber nada em troca… sim, porque o nosso medo não é dar, o nosso medo é não receber, é sentirmos que estamos a amar em vão, é sentirmo-nos sós, sentir que demos tudo, e como não recebemos ficámos vazios.
É por isso que nos entregamos a frivolidades mundanas, a orgasmos fáceis com desconhecidos tão voláteis como nós. Porque quem amávamos estava ali mesmo ao lado, e nós recusámo-nos a deixar-nos levar por esse sentimento arrebatador, com medo de ficarmos com ele nas mãos, ou sem ele, e sem nada em troca. Sanguessugas excitadas por palavras ocas, somos estripadores sentimentais, que se atravessam no caminho uns dos outros, esquivando-se milimetricamente das escassas sombras de sentimentos que vamos vendo perdidas por ai. Somos tarados sexuais a aproveitarem-se uns dos outros, somos crianças inocentes que suplicam carinho com gritos e berros, para não termos que ser nós a dar o primeiro passo, o primeiro beijo, o primeiro suspiro.
Porque amamos, e dizemos que amamos, e utilizamos esse amor como estandarte doloroso, mas só depois de sermos deixados para trás, só quando já não há nada a fazer, porque somos masoquistas. Porque na realidade não queremos fazer ninguém feliz. Queremos que alguém viva para nós, que nos satisfaça a todos os níveis sem pedir nada em troca, porque os nossos gestos esquivos têm que ser suficientes, porque os nossos carinhos escondidos, as nossas palavras suaves ditas em ardores nocturnos de sofreguidão conjunta têm que ser suficientes, porque as palavras comprometem-nos, e assustam-nos, porque nos obrigam a assumir algo, a sentir algo, a partilhar, a dizer ao mundo que partilhámos, a dizer ao mundo que sentimos, a dizermos a nós mesmos que somos frágeis, que amamos, e que podemos vir a ser amados de volta, e isso faz-nos vulneráveis, isso faz-nos menos que humanos, faz-nos pedir e suplicar por mais.
Mais carinho, mais amor, mais atenção, mais um beijo, mais um minuto, mais um abraço, mais, sempre mais.
E depois choramos as ausências, sentimo-nos abandonados e traídos, atiramos culpas ao vento, abandonamos a nossa própria vida porque ela parece deixar de valer a pena, porque perseguimos e atiramos coisas em cara, porque sentimos ciúmes, porque nos abandonamos ao desespero de não podermos ter o que queremos, porque só queremos porque não podemos ter... porque somos estúpidos, hipócritas e egoístas. Egocêntricos atordoados por delírios esculpidos no meio de dois corpos unidos pelo acaso, que depois se despem um do outro sem se despedirem, e o tempo segue o seu rumo como se nada fosse.
Somos refugiados de guerra, abrigados no beijo de quem estiver mais próximo, escondidos nos lençóis que se apresentem mais confortáveis. Somos prostitutas de sentimentos, vendemos este amor tão grande que sentimos por um pouco de atenção, por um beijo mais fácil, por uma noite descomprometida, por um amanhecer a dois seguido de… nada, então não temos medo, nem vergonha… podemos amar à vontade porque este compromisso não passa da alvorada.
03/03/2008

sexta-feira, fevereiro 29, 2008

One more day in the city...

Nem sei porque estou aqui.


A cidade envolve-me sem nunca me deixar sentir que aqui pertenço.


As horas deixam-me a vaguear por aqui eternamente, porque se recusam a passar, esqueceram-se de mim... o meu passo não se altera, segue cadenciado com as batidas deste meu coração teimoso.


Não sei porque estou aqui mas...


... antes aqui que noutro lado qualquer.


quinta-feira, fevereiro 21, 2008

How to save a life

"Step one you say we need to talk
He walks you say sit down it's just a talk
He smiles politely back at you
You stare politely right on through
Some sort of window to your right
As he goes left and you stay right
Between the lines of fear and blame
And you begin to wonder why you came

Where did I go wrong, I lost a friend
Somewhere along in the bitterness
And I would have stayed up with you all night
Had I known how to save a life

Let him know that you know best
Cause after all you do know best
Try to slip past his defense
Without granting innocence
Lay down a list of what is wrong
The things you've told him all along
And I pray to God he hears you
And I pray to God he hears you

Where did I go wrong, I lost a friend
Somewhere along in the bitterness
And I would have stayed up with you all night
Had I known how to save a life
How to save a life

As he begins to raise his voice
You lower yours and grant him one last choice
Drive until you lose the road
Or break with the ones you've followed
He will do one of two things
He will admit to everything
Or he'll say he's just not the same
And you'll begin to wonder why you came

Where did I go wrong, I lost a friend
Somewhere along in the bitterness
And I would have stayed up with you all night
Had I known how to save a life
How to save a life
How to save a life

Where did I go wrong, I lost a friend
Somewhere along in the bitterness
And I would have stayed up with you all night
Had I known how to save a life
How to save a life
How to save a life
How to save a life"

The Fray - How to save a life


Às vezes um sorriso era suficiente...
Às vezes um sorriso era só o começo.
Às vezes uma sala vazia tinha gente a mais...
Às vezes a solidão batia-me à porta.
Às vezes qualquer coisa era melhor que nada...
Às vezes um "Olá, ainda estou aqui" resolvia tudo.
Às vezes um pouco de ti fazia-me esquecer que eu sou eu...
Às vezes uma presença silenciosa fazia milagres.
Às vezes fui dificil...
Às vezes também foste.
Às vezes a culpa foi minha...
Às vezes a culpa foi tua.
Às vezes, a culpa não foi de ninguém, foi porque foi e "o que foi não volta a ser"...
Às vezes, mas talvez só desta vez, meia dúzia de palavra alinhadas ao acaso, servem como uma espécie de despedida.

R.

domingo, janeiro 27, 2008

Fácil de Entender

"Talvez por não saber falar de cor, Imaginei
Talvez por não saber o que será melhor, Aproximei
Meu corpo é o teu corpo o desejo entregue a nós
Sei lá eu o que queres dizer, Despedir-me de ti
Adeus um dia voltarei a ser feliz


Eu já não sei se sei o que é sentir o teu amor,
não sei, o que é sentir, se por falar falei
Pensei que se falasse era fácil de entender


Talvez por não saber falar de cor, Imaginei
Triste é o virar de costas, o último adeus
Sabe Deus o que quero dizer


Obrigado por saberes cuidar de mim,
Tratar de mim, olhar para mim, escutar quem sou,
e se ao menos tudo fosse igual a ti[2x]


Eu já não sei se sei o que é sentir o teu amor,
não sei o que é sentir, se por falar falei
Pensei que se falasse era fácil de entender


É o amor, que chega ao fim, um final assim,
assim é mais fácil de entender[2x]


Eu já não sei se sei o que é sentir o teu amor,
não sei o que é sentir, se por falar falei
Pensei que se falasse era fácil de entender"


The gift, fácil de entender


para ti, a quem um dia disse tudo...


quarta-feira, janeiro 23, 2008

Hoje

Hoje não queria morrer. Há muito muito tempo atrás sim, mas hoje? Não. Hoje eu estava disposta a dar os passos todos que tinham que ser dados. Disposta a terminar todas as etapas, disposta a sorrir a viver um pouco, a experimentar os caminhos que me apontaste, a apreciar as pessoas e as conversas, hoje eu estava disposta a fazer essa “amizade” durar para sempre.Mas hoje achaste que não, talvez te tenhas cansado da monotonia de uma amizade assim, ou tenhas tido medo da ausência que vem a seguir, simplesmente achaste que não, e mataste-me.Arrancaste-me ao teu dia-a-dia, e foi como se nada se tivesse passado na tua vida.Hoje, talvez tarde demais, hoje eu precisava de viver, mas hoje tu mataste-me… porque me tiraste o porto onde me segurava, e o horizonte parece agora demasiado longínquo para eu nadar até lá.Hoje é um dia demasiado relativo, para ti é o futuro, e para mim, hoje, é o passado que regressa trazendo a vontade de desistir de amanhã.

segunda-feira, janeiro 21, 2008

...

Repito-me, porque na vida tudo se repete... vezes e vezes sem conta.

"Como a peça de um puzzle que teima em não encaixar em lado nenhum. Isolada comigo mesma, não importa para que lado me vire, apenas encontro mais espaços vazios. Não há amigos ou família que me valham, porque também aí nunca encaixei.A solidão não me incomoda, nunca me incomodou. As refeições sozinha também não. Apenas começam a pesar as lágrimas que guardei nos bolsos, e as palavras que escolhi nunca dizer. Pesam as toneladas de sentimentos que nunca demonstrei, pesam os problemas que guardei para mim mesma. As preocupações, os medos, as euforias contidas. Pesa-me a minha própria sombra…Sinto o coração a diminuir de tamanho, as dores dos outros começam a deixar de me preocupar, à medida que vou sendo atropelada pela realidade da minha própria vida. Vida que não é vida, nunca foi. São passos mecânicos que vou dando ao longo do tempo, sem sequer me aperceber deles, tudo o que eu sou, o que eu fui, as metas, os desejos, eu mesma, a pessoa que gostava de ser, tudo isso ficou cá dentro, pura e simplesmente porque não se encaixava lá fora. E eu nunca quis ter que forçar-me a encaixar em lado nenhum.Continuo à deriva por aí. Sorriso de plástico colado no rosto, observando os outros, dando uma mão quando alguém precisa, mas ao fim do dia regresso ao meu canto. Envolvo-me nas minhas coisas e choro, porque mais uma vez me escondi em mim mesma, pelo bem das aparências, mais uma vez escolhi mostrar apenas o lado bom, pus mãos à obra, e esculpi uma nova pessoa aos olhos do mundo.Desenhei-a em cima do joelho, contornos bem carregados, interior meio difuso, para ninguém conseguir ver o que lá vai dentro.Tenho as lágrimas tatuadas no meu rosto, e no entanto ninguém parece dar por elas. O meu único desejo era conseguir desistir, mas não posso. O meu mais alto objectivo, era ser de facto transparente. Sinto-me assim, a cada dia mais, mas continuo a ver o meu reflexo no espelho, continuo a sentir os soluços virem de dentro. As mãos continuam roxas de frio, as faces rubras da raiva de ser assim.Não pedi a ninguém para nascer. Não há nada que me leve a querer ver mais um dia nascer, sei que o mundo irá continuar sem mim.Estou demasiado perdida, no labirinto de mim mesma já bati em demasiadas paredes, e em nenhuma delas gritei, porque algures no caminho encontrei uma placa que dizia “Não incomodar”. Eu não incomodo, juro que não. Fico aqui quietinha, e amanhã saio de novo à rua com um sorriso forçado. E no outro dia também, e no outro, e no outro… e no fim, quando eu morrer, as pessoas que ficarem não se hão de recordar do meu nome, serei apenas aquela miúda caladinha que tinha sempre um sorriso nos lábios."
18/11/05

... palavras de um dia negro

"A chuva caía na rua, pingos finos, estridentes nas pequenas poças que se acumulavam na estrada. Não havia ninguém na rua, o final de um sábado desconfortável era sempre assim, as pessoas fugiam para as suas casas quentinhas, e ele ficava ali, jogado no meio da rua, ao frio, ao vento...

Já não sabia viver senão assim, havia sempre alguém que lhe dava um agasalho, e tinha sempre a sopa quentinha ao cair da noite, junto ao lar de idosos. Mas hoje sentia-se diferente, algo não estava bem... um desconforto extra, inexplicável, porque dias como aquele traziam-lhe sempre boas recordações.

Chamava-se Joaquim Ernesto Santos Pardal, e tinha nascido há quase 40 anos na bela cidade de Luanda. Os pais haviam regressado a Lisboa sem nada, e haviam morrido de fome e frio há mais de 30 anos. Joaquim ficara entregue a orfanatos, de onde saíra com 18 anos, para trabalhar.

Cedo desistiu, e se meteu em tudo o que havia de mau, experimentara todas as drogas, dormira com todas as mulheres, da pior reputação, roubara, destruíra, embora nunca houvesse ferido ninguém. Não gostava de trabalhar, e não precisava, vivia na mesma, e livre, como gostava de pensar.

Era um homem grotesco... atarracado, com uma barba grande e malcheirosa, o cabelo bem comprido, roupas rasgadas, com um cheiro animalesco, um chapéu que um dia fora branco, mas que hoje era um emaranhado acastanhado de fios e ninhos de piolhos, possuía um olhar esgazeado, em tons de castanho, quase negro, e a sua pele estava tão queimada e rasgada pelo frio, parecia esculpida em pedaços de xisto.

Nunca saía do cais... no máximo, passava por Santos à procura da dose diária... e não se lembrava de ter viajado para além do Marquês, o dinheiro vinha sempre até ele.

Sentia-se demasiado importante, demasiado livre para se dar ao trabalho de gastar energias assim.

Estava no meio do Bairro Alto, e subia calmamente a Rua do Alecrim para se ir encontrar com o trafulha do Armindo nas traseiras da estação do Chiado, dizia ele que tinha produto do bom, quando viu que em sentido contrário descia uma miúda a chorar.

Joaquim não pensou, encostou-lhe a sua faca de algibeira à barriga e de repente a miúda agradece-lhe, agarra-o e faz com que a faca se espete no seu ventre.

Ele correu, chorou como nunca, e correu, entrou na estação e saiu de Lisboa, para nunca mais voltar.

Maria, a miúda chamava-se Maria. Tinha 14 anos, acabara por sucumbir depois de meia hora no meio da rua sozinha. Na sua sacola haviam encontrado uma carta de despedida, pelos vistos ia a caminho da linha do comboio, para mais uma tentativa de suicidio.

Joaquim morreu no dia seguinte, com um ataque cardíaco, no entroncamento, à espera do comboio que seguia para Coimbra."

PS - as personagens, acontecimentos e nomes são pura ficção... (de um dia muito negro!)

domingo, janeiro 20, 2008

Suspiro...




Suspiro, como o suspiro de um fantasma...




Se eu morresse hoje, era assim, como se nada fosse, algo suave, que desaparecia com um rasto amargo, quase imperceptível, que iria deixar meia dúzia de cabeças voltadas a pensar o que se passava ali.


Só os fantasmas iriam suspirar... um deles havia partido...

Forget-me-not

sexta-feira, janeiro 18, 2008

Logo se vê

E do modo mais inesperado o horizonte abriu-me as suas portas... o deslumbramento do que se deparava à minha frente silenciou tudo o resto, como se de mim mesma me fizesse esquecer, e agarrando-me pela mão, levou-me a conhecer o mundo lá fora.


Fascinada, segui aquele trilho percorrido milhões de vezes por pessoas perdidas como eu, corri por ali, estaquei, apreciei, vivi e morri num momento qualquer que ninguém viu, mas a esperança voltou a mim... sim, talvez ainda seja possivel seguir em frente, talvez ainda hajam pessoas lá fora, se calhar a mudança é suficiente, e nas etapas que hão de vir, o estar sozinha não seja um entrave...


Talvez seja suposto amar assim em silêncio para sempre, e seguir para outro lado qualquer contigo no coração, e os olhos noutro lado qualquer...


Porque a incerteza me acompanha há tanto tempo, tenho a consciência que ainda te amo um pouco, de um modo diferente, mas que de uma maneira ou de outra, continuas presente em mim, porque não te quero ver partir... porque te admiro de uma maneira muito especial, porque às vezes quero acreditar que me conheces como ninguém, e porque tinhas razão, a solução aparece sempre, e tudo vai correr bem!


Hoje quero acreditar que sim... tudo vai correr bem, porque tu disseste que sim, e eu quero que sim, e se não for verdade não vai fazer diferença, não hoje, e amanhã... logo se vê.

sábado, janeiro 05, 2008

"E de mim me desprendo... sem vontade de ir nem ficar... dormir sem ter horas, dormir para sempre, dormir até que descubras a verdade e me libertes desta minha agonia de ser eu mesma sem sequer existir.


Vontade de abandonar tudo... de correr até que a pulsação acompanhe os raios de luz que outrora te iluminaram e te fizeram um pouco meu, porque te vi ali e sabia que nunca mais te voltaria a ver.


Desespero de ser ignorada, revolta, agonia... OUVE! Sei que não falo muito, e do pouco que digo a maioria são disparates, piadas, palavras soltas que vos atiro para que nunca saibam quem sou, o que sou, ou sequer se estou, mas...


Não, as palavras já não me acompanham, estou só de novo, tenho tanta coisa para dizer, tanta coisa para contar, tanta coisa tão irrelevante e no entanto as palavras abandonaram-me e vejo-me forçada a soltar estes lamentos desesperados, estes gritos solenes, estes chamamentos incoerentes para que elas voltem, porque continuo a não gostar de mim assim..."








Algures, num tempo que nunca foi, numa noite solitária, em lágrimas derretidas e com soluços esculpidos pelas mãos de alguém que nunca soube quem sou, nessa noite eu perdi a capacidade de escrever. Por vezes tenho uma vontade tremenda de me agarrar de novo a folhas de papel soltas e deixar que as mãos sigam por ali... mas os resultados são sempre os mesmos...

Não sei de mim, se alguém me vir a passar, por favor mostrem-me o caminho de volta.